Hoje, há a bancada dos bancos, a das empreiteiras... Ideal seria a
Justiça cassando candidaturas e legendas que captassem verba privada. O
país ganharia muito
"Dize-me quem te financia que eu te direi quem representas" é uma boa
atualização para a antiga máxima popular. O modelo de financiamento
privado de campanhas degenera a democracia representativa, pois os
eleitos são a voz do dono; este, seu patrocinador, é o dono da voz.
Repete-se, no Brasil republicano do século 21, uma característica dos
tempos coloniais: um Estado carregado de interesses particulares.
Entre nós, as eleições bienais ficam cada vez mais caras, impedindo que
as maiorias sociais tenham a devida expressão política. A empreitada
milionária produz resultados previsíveis: quem mais arrecada mais chance
de vitória tem.
Além disso, o acordo interpartidário tem fundação sólida em programas...
de TV e rádio. Depois, na partilha do governo. Nada de doutrinas: todos
podem se aliar a todos.
O ex-governador José Roberto Arruda, do Distrito Federal, com
conhecimento de causa, abriu o jogo: "Empresas e lobistas ajudam nas
campanhas para terem retorno, por meio de facilidades na obtenção de
contratos com o governo. Ninguém se elege pela força de suas ideias, mas
pelo tamanho do bolso."
As contas das últimas eleições municipais revelam que o financiamento
dos candidatos eleitos para as prefeituras nas capitais e grandes
cidades (e isso apesar de 80% de "doações ocultas"...) é similar ao
financiamento que constituiu o Congresso atual: cerca de 60% dos
deputados e senadores receberam, declaradamente, recursos de
empreiteiras e conglomerados bancários.
Forma-se a bancada da Vale, da Camargo Corrêa, do Itaú, da OAS, da
Andrade Gutierrez, da Gerdau, do Bradesco, do agronegócio... Tudo
legitimando o poder do capital privado nos Executivos e nos
Legislativos.
Há um novo formato, ardiloso, para dissociar as candidaturas de seus
nada desinteressados patronos: empresas "doam" generosas somas aos
grandes partidos, depois destinadas às campanhas sob a rubrica secreta e
legal do "diretório partidário".
Tais repasses contrariam a cobrança do Barão de Itararé, há meio século:
"Quem cabra dá e cabrito não tem precisa explicar de onde vem". A quem
serve um sistema tão avesso à transparência?
Nosso problema político central é a promiscuidade entre o público e o
privado e o clientelismo patrimonialista. A sangria do erário seguirá
enquanto não se aprovar financiamento público e limites claros na
relação entre autoridades e empresariado.
A adoção do financiamento exclusivamente público e austero de campanha é
imperativo democratizante. O voto partidário, em lista pré-ordenada e
flexível, com possibilidade de interferência do eleitor, é o que mais se
adequa a esse modelo.
A Justiça Eleitoral determinaria a cassação de candidatos e legendas que
captassem dinheiro de empresas privadas. A medida, ao contrário da
aparência, desoneraria o erário, debilitado pela corrupção sistêmica, e
reduziria a disparidade na disputa.
Há também propostas progressivas, como restringir as contribuições a
pessoas físicas e os valores totais, mas os que fazem política de
negócios rejeitam até isso.
O povo, que é induzido a não querer "dinheiro dos impostos na política",
também descrê da representação que elege: porque muitos gastam na
conquista de votos mais do que a remuneração que terão ao longo do
mandato? O apreço pela democracia impõe mudança em um sistema que
condiciona o direito de votar e de ser votado à propaganda enganosa e ao
poder econômico.
POR CHICO ALENCAR-professor de história e deputado federal pelo PSOL-RJ
POR CHICO ALENCAR-professor de história e deputado federal pelo PSOL-RJ